PATRÍCIA PINHEIRO – 4 Poemas
PATRÍCIA PINHEIRO – 4 Poemas

PATRÍCIA PINHEIRO – 4 Poemas

A poeta Patrícia Pinheiro dá início a uma série de publicações por aqui. Vai abrir os caminhos de um espaço que visa abrir caminhos. Uma honra para o LOB. Autora do livro Quadripartida, traz agora para nós quatro poemas que são quatro pés direitos dando o primeiro passo neste projeto. Um mergulho quase onírico nas angústias de nossos dias. 

Revista O Navalhista

mãe,

eu tenho medo

de adoecer.

e eu falo mãe

querendo dizer deus

ou alguém qualquer

que se arrepie

diante de tantas sobras

que só dilatam faltas.

mãe,

as paredes têm ouvidos

e olhos gigantes,

mas elas só rodopiam

quando eu apago as luzes

e nunca me contaram

histórias bonitas

para dormir.

eu acho que já adoeci

e me curei

e adoeci

em silêncio

tantas vezes, mãezinha

que desaprendi

a dizer onde dói.

me empresta teu par

castanho-escuro

de estrelas cadentes até

os milagres

que me curem de mim?

Revista O Navalhista

Nos preâmbulos

silenciosos

do sono,

meu inconsciente

grita

necessidade de afago

sem espinhos,

de anestesias

intocadas por drogas

sintéticas,

de esperas livres

da cruel incerteza

das chegadas.

Ele me somatiza

inteira

para lembrar

que é urgente

plantar macieiras

em cima de sentimentos

áridos,

reaprender a sonhar

em cores

e acender velas

aos nossos mortos

como quem carrega

um respeito terno

e dolorido

pela vida.

Revista O Navalhista

Será que os filtros dos sonhos

sempre foram pessoas?

Será que esta boca inflamada

é câncer

ou apenas palavras

enferrujando nas cordas

vocais?

Será que a couraça

de quem não tem um teto

realmente é mais grossa

ou o véu que os separa

do outro mundo

que é mais fino?

Será que tenho lavado as mãos

por tempo suficiente

antes de ensaiar um toque?

e como será que o presidente

consegue sequer comer

com as dele

ensopadas de sangue?

Será que nossas crianças

terão mais medo da luz

do que do escuro?

e será que elas

conseguirão

cair no sono

antes do banho?

Será que minha mãe também

sente falta de um abraço?

e será que a minha infância

ainda cabe no dela?

Será que velar um pai

um dia acaba?

Será que a felicidade

não deveria se chamar

alívio-entre-espantos?

e será que morrer

também é se esquecer

de fazer perguntas?

Revista O Navalhista

A solidão embotando as garras.

A memória celular inflamando os calcanhares de Aquiles.

A poesia e a aritmética

tateando equilíbrio

em tempos de cegueira.

É difícil não fazer do outro

uma oração.

*Publicado inicialmente em nosso site anterior, chamado Literatura & Outros Blues, no dia 18/07/2021.

Sobre a autora:

Patrícia Pinheiro

De 1992, de Santa Maria da Boca do Monte para a Iha da Magia e, agora, para a Selva de Pedra, Patrícia Sebastiany Pinheiro é psicóloga por formação e poetisa e escritora por necessidade e desejo. Trabalhou como colunista de sites como o HuffPost Brasil e o CONTI outra e seus escritos circulam pelas redes sociais, revistas e concursos literários. Quadripartida é seu primeiro livro. No Instagram é @pppoemas.

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