REVISTA NAVALHISTA – Madame Lua é sua estreia, saindo neste ano pela Editora M.inimalismos. De onde vem sua Lua? Como surgiu essa personagem? É difícil criar a “história de uma estrela”, a “mulher mais desejada e amada de toda a Via Láctea”?
FÉLIX KAIROS – Isso é uma pergunta que me faço o tempo todo. Eu trabalho sempre com personagens difíceis – é o que me motiva –, escrever para mim é um processo de insanidade, no melhor sentido. Eu me sinto igual no Animal Planet, observando o leão deitado, porque parte do meu trabalho é realmente observar a vida da cultura pop. A Lua veio primeiro como um pensamento de uma lenda sobre o próprio satélite, onde ela cantaria para embelezar a noite. Só que eu quis trazer algo mais místico e mais simbólico. Foi meu primeiro livro que não é de fantasia. Madame Lua mistura a loucura e o talento de grandes artistas como minha diva maior Rita Lee, como David Bowie, que eu sempre reverencio, como Lady Gaga, Mariah Carey, Ney Matogrosso, os Sex Pistols, a Patti Smith, Bibi Ferreira até a Pati LuPone, enfim, é uma leitura muito ampla, muito viva. E ela é esse corpo violento e poético que se destrói para compor até não sobrar mais nada dela. Então foi muito difícil escrever, foi doloroso. Eu admito que já chorei relendo. Tem o capítulo do gato Beethoven que é o meu favorito e ele é muito íntimo. Particularidade minha: quando escrevo, odeio longas descrições, é chato para mim e é chato para o leitor, mas eu adoro aprofundar na construção da personagem, minha especialidade como escritor e crítico literário é isso. Por isso esse capítulo é tão absurdo e tenso, você vai caindo junto da personagem. Mas esse é o processo necessário para se escrever uma Madame Lua.
R. N. – Você abre o livro dizendo que não dedica a obra em alguém em específico. Mas dedica a todos “os artistas malditos, doentes, doidos e difíceis de lidar.” Aqui nós queremos nomes. Queremos saber quem faz a cabeça de Kairos.
F. K. – Os músicos que eu já citei falam muito, mas eu diria que na arte sempre teve mais malditos, inclusive eu, porque somos sensíveis demais. Oscar Wilde é a minha diva real da literatura, foi um corpo de guerra perante um Estado de ódio. Há outros autores fantásticos como Antonin Artaud que era louco, mas não porque ele estava internado, mas porque ele é um fluxo de criação, um corpo sem órgãos algum para o que a violência do organismo social não conseguisse o atingir. E assim há inúmeros nomes, artistas drogados, alcoólatras, maníacos, esquizofrênicos, loucos, masoquistas, todos têm um valor ímpar para uma narrativa da arte. O sistema tenta apagar a existência desses corpos indesejados de várias formas: a morte é a mais ineficiente, então muitas vezes é por meio da tortura, da desfiguração ou da ridicularização. Há sim vários nomes a citar, mas todas elas são exceções, a grande maioria morreu em campos de extermínio, em guerras vazias, nos hospícios. São esses corpos que Madame Lua é dedicado, não só pelo que sofreram ou sofrem, mas porque Madame Lua é sobre Orfeu, o poeta-messias que ergue o Sol com sua música. Se Lua é a queda, a depressão; Oorum é a vida, é a retomada da existência, que jamais é uma adequação. Esses corpos, como Oscar Wilde e Artoud, não precisam e não devem ser agradáveis, parte da arte será sempre desagradável para quem busca uma leitura rasa e bonitinha.
R. N. – Em um texto curto para rede social, você diz: “Porque é isso que nós, minorias, precisamos: corpo de verdade, vidas possíveis”. Parece-nos uma sentença bem carregada, com um grito oculto, impossível de se reproduzir em um texto curtinho de rede social. Gostaria de falar sobre isso?
F. K. – Na verdade, é algo realmente muito complexo. Eu não gosto de gastar a palavra fascismo à toa, porque vivemos na iminência de um ato cruel no mundo e é bom guardar, mas no sentido de controle dos corpos, esse fascismo nunca acabou. Autores como Foucault, Deleuze & Guattari e tantos outros debruçam-se nessa vida marginal, onde o corpo é violado pelos poderes e micropoderes, isto é, o Estado querendo cuidar de quem você pode transar, amar, beijar. O Estado diz que gays, lésbicas, bi e trans não podem ter filhos porque “influencia mal” e só não faz isso com pessoas pretas héteros hoje, porque pegaria muito mal mesmo entre a extrema direita. Ora, eu vivia todas as férias ao lado de tios desprezíveis politicamente e socialmente, além de alcoólatras. Só falavam merda sem qualquer preocupação de estar do lado de crianças, e as esposas não ficavam para trás, não. Eu saía desses encontros queimadinho de radioatividade. Se isso é um exemplo hétero, justifica-se a merda social em que estamos. Um desses, inclusive, teve a falta de vergonha de abandonar um filho. Todos os meus tios supostamente héteros – até porque sexualidade é performance e não o que se faz na cama. O Estado nunca obrigou que ele assumisse o filho. Isso não é uma guerra deles contra nós, é só uma reflexão. Eu nunca vi uma pessoa queer abandonar um filho – Mas os vilões somos nós. Por sorte, tive pais ótimos, na medida do possível, muito liberais ao ponto de me permitir ser um libertário. Então é fundamental partir daqui, não somos corpos bonitinhos, por isso nos agridem. Se eu faço um mundo colorido, não tô representando nenhum de nós. Nós somos essa falha, não somos limpinhos, somos estranhos perante o Poder, descaracterizar nossa leitura perante o novo mundo é higienizar nossa vida, porque nós tivemos de nos adaptar por milênios não para viver como eles, mas para reestabelecer novas linguagens sociais, políticas e artísticas. Não somos simples de entender. Esse mundo novo que “nos aceita se não formos afeminados, se não formos mais de uma minoria, se não tivermos doenças e se não formos mulheres caminhoneiras de modo nenhum” não é nosso, é um mundo lindinho para pessoas héteros praticarem sua bondade divina e heroica ao aceitar a aberração queer. Hoje temos infinitas peças de arte pop LGBT, feminista, negra, pcd, mas quase sempre limpa. Elas não querem nos mostrar como sujos, no sentido da Sofia Favero, um corpo que nasceu para morrer, mas que se mantém potente em luta. Não querem nos mostrar sujos, mas também não querem nos ver como limpos na vida real. Quando nós, minorias, nos aceitamos sujos e vilões, isso assusta a cisheteronormatividade. Então, quando o discurso é só “olha, eles são gente também”, é legal, não há como negar. Gosto muito de Heartstopper. Muito bom ver adolescentes fofos se beijando, mas isso não somos nós, isso não nos representa, nunca representou e não nos ajuda a sermos vistos. Tudo parece uma tentativa de amenizar o nosso Malcolm X e transformar em um grande Tio Barnabé. “Aceita eles, olha como agem como se fossem gente”. Por isso, corpos de verdade precisam ser possíveis, porque somos mais do que a face limpinha da televisão e do celular.
R. N. – Você publicou seu primeiro livro “Carnal” (Caravana, 2022) assinando com Félix de Alcântara. Hoje, “entre o Niilismo e a Anarquia” – como te apresenta sua nova casa editorial, assina com Félix Kairos. O que aconteceu? O que te leva a mudar o nome?
F. K. – Eu não alterei, na verdade, eu acrescentei. Carnal foi um texto um tanto imaturo, mas eu não apago nada da minha história. Pois eu sou um corpo múltiplo e louco. Eu sou um momento divino.
Eu me chamo Gabriel Félix de Alcântara. Nasci em Divinópolis, Minas Gerais, numa terça, dia 3 de março de 1998. Sempre tive orgulho de meu aniversário, porque três é meu número: as moiras, o tridente, os três atos de uma peça sobre minha loucura e um futuro que já vivi. Nasci de cabelos morenos, olhos escuros, pele mais ou menos branca, tamanho médio, uma criança disfuncional num lar estranho, mas amoroso. Cresci numa autorrepressão que não fazia sentido de onde vinha. Nunca acreditei em deus, nem por um dia.
Eu me chamo Félix de Alcântara. Sou um corpo real, em uma mente disfuncional. Magro e desconfortável. Escrevo todos os dias para suprimir uma falta. Mas de quem? De pai não é, o meu foi muito bem presente e deus não existe. De mãe? Não faz sentido, eu tenho em excesso. Minha mãe e eu nunca nos demos bem, mas às vezes ela é divertida. Eu me sinto um corpo contagioso.
Eu me chamo Félix Kairos. Eu sou uma contradição. Eu sou um corpo múltiplo, uma mente múltipla. Eu sou esquizo e a ruptura divina. Sou politeísta, acredito no devir de Ney, na mística de Rita e no cosmo de Bowie. Meu p(r)o(f)eta é Oscar Wilde que canta para a lua subir. É a Lua quem sirvo, ela é a dama de Argento, é ela quem guarda os sonhos das crianças. E são nestes sonhos que vive a utopia, um desejo final. Eu sou Oliver Wilde. Eu sou Gabriel Vaslav. Eu sou um paradoxo. Eu sou feito para a falha e, quando não posso mais falhar, eu acerto a contragosto. Eu sou todos esses corpos e eles não são eu. Me reescrevo e reescrevo dia após dia até sangrar, porque eu acredito na imortalidade. E eu a temo profundamente.

R. N. – Vamos falar sobre literatura infantil. Qual sua relação com a categoria? Ficamos sabendo que vem projeto novo pela frente que vai por esse caminho. Pode adiantar algo?
F. K. – Ah, essa é uma pergunta muito divertida para mim. Hoje, eu não me prendo muito ao tipo de texto que irei escrever, só que isso não foi sempre. Em 2020, eu pesquisava uma poeta chamada Henriqueta Lisboa lá na UFMG, eu gostava, mas estava adoecendo, eu me negava a me priorizar. Afinal, eu sou metódico, obsessivo, gosto de controlar minha narrativa. Muito por isso, é bem difícil me derrubar num texto, porque eu sou um pesquisador muito analítico e certeiro. Quando terminei minha primeira monografia, que foi muito elogiada, eu tinha passado por uma humilhação de um orientador porque eu não entendi o sentido da palavra raça no contexto da autora, basicamente me chamou de incapaz. Mas tudo bem, quando eu não derrubo no argumento – e eu derrubei –, eu vou é na magia. No caso, foi nos dois. Quando terminei, eu disse que nunca mais escreveria para adultos, de prepotência já basta a minha. E foi assim por 3 anos, eu escrevi loucamente para crianças porque achava – ainda acho – que criança é muito superior mentalmente do que um adulto médio. Sempre foi sobre crianças bagunceiras, questionadoras e vilãs. Eu tenho paixões por vilões. Todo esse amor pelos livrinhos infantis sempre foi potencializado pelo meu desejo de ter dois meninos. Meus pequenos poeminhas, Oliver e Elio. Porque eu acho que a pulsão do amor de pai que assume e ama é a mesma pulsão do amor de um escritor. Eu não quero meus pequenos emburrecidos, educadinhos e recatados, quero que sejam bagunceiros, glam e punks. Madame Lua, inclusive, foi o que cortou temporariamente o fluxo de livros infantis. Mas eu sempre volto, a primeira retomada foi quando meu sobrinho Cristiano nasceu. Eu tive o sentimento tão quente – como eu amo esse bichinho –, como um abraço de um bicho-preguiça em mim. E aí eu escrevi um livro sobre um menino glamouroso: Poeira de Estrela (ou Stardust) que conta a história de David, um futuro rock star de nove anos, que está sentado no Sol olhando e roubando estrelas. Então, o narrador resolve brincar com nosso amigo David e os dois saem bagunçando tudo que podem dos planetas da galáxia. Mas, apesar de ter escrito isso, eu assumo que nunca lembro que Plutão saiu dos planetas, totalmente out of stock. É um sentimento único que sinto quando lembro dessa história, até já escrevi as continuações sobre outros meninos bagunceiros como a vovó Rita, o rival Elton e a Bicha-Papão, a estilista. Os desenhos estão fabulosos e queer, feitos pela minha talentosa amiga Clara Oliveira. Eu tô só esperando sair para ir correndo até meu sobrinho e contar eu mesmo a história de um menino David que eu conheci no espaço. E também tô pensando seriamente em convidar ele para ser da minha tripulação de piratas. Mas fora isso, eu tenho de tudo, de bons elementos como Krampus, Cuca, Baba Yaga, Bicha Papão, o duende Puck, estilistas, robôs, dragões, gato pirata, eu mesmo, tamanduá bandeira alienígena até maus elementos e de péssimo gosto tipo Papai Noel e Coelhinho da Páscoa. Eu estou sempre na vanguarda do livro pedagógico.
R. N. – Sobre seu processo de escrita, o que funciona, o que não funciona? Fala algo excêntrico, que você jura que só Félix Kairos faz enquanto escreve.
F. K. – Eu sou disléxico. Escrever é meu primeiro ato excêntrico e de revolta. Eu escrevo ao extremo. Definitivamente, algumas coisas não funcionam, porque eu experimento de tudo. Eu gosto de testar possibilidades, narrativas, estruturas, fundir gêneros, quebrar barreiras de comunicação. Fato divertido para mim: não que seja exclusivo meu, mas eu tenho um grupo de livros com humor carnavalizado ao extremo. Há um desses, chamado Ecos, que é sobre uma bruxa louca e um narrador completamente insano, que não respeitam absurdamente nenhuma informação dentro do texto e que vivem manipulando a história de dentro da Loja Mágica de artigos de bruxas – não respeita nem o nome do gato, que muda a cada página – ainda nem terminei (se é que conseguirei um dia), é o meu Finnegans Wake que eu não consigo escrever mais de um capítulo por semestre. Então esse é meu algo excêntrico: masoquismo. Meus textos são, normalmente, insanos. Meus narradores são personagens e são completamente não confiáveis. Eles mentem, zombam da história, fazem piadinhas inoportunas, conversam com a personagem e, fundamental, têm posição política perante a história. Como eu tensiono ao extremo a narrativa para entender como posso lidar com tal tópico, muitas vezes o tom do texto vai embora. Se ficou chato pra mim, eu nem continuo. Detesto ler livro chato. Atualmente tô lendo vários livros, sempre uns 6 ou 7, mas ativamente só 3. Além de teoria, é claro. Mas eu faço esse masoquismo porque eu preciso me alimentar. Por exemplo, amo pensar em Maurice Sendak, um gênio da literatura infantil, assim como Patti Smith, que tem uma narrativa absurdamente intrigante na autobiografia. É isso que eu busco no meu texto. Não é uma originalidade de uma mata virgem, não me interessa ser um pioneiro de nada, eu gosto de ser um filósofo da arte. Hoje mesmo eu estou obcecado com a carta do Louco, do tarot, que é o meu arcano maior. Ele é esse corpo em movimento, à beira do caos que é existir. Guardando um pouco de passado necessário no saco e o resto é abismo e loucura. Eu gosto de escrever rápido, porque eu aprendo muitas coisas esquecendo que um Félix existiu ontem, e como eu nasci hoje, tudo é divertido e complexo. Eu gosto de revisitar e reaprender, eu acho que toda peça é reconstruível, ou melhor, Frankensteinizável. Se eu pudesse reviver o dia em que escrevi Madame Lua, com certeza eu pensaria em: quando abrisse a primeira música, ao invés de “so this is love”, que é de Cinderela e que serve para dar uma quebra de expectativa por ser uma roqueira, colocar a letra de Rita Lee que diz “I wanna be a star”. É o que penso sobre meu trabalho, um enorme experimento que serve, no fim, para eu mesmo rir das próprias loucuras. Erros e acertos ainda sou eu. Ou talvez não, isso é coisa para o Félix, que vai nascer semana que vem, preocupar.
R. N. – Ao lermos Madame Lua, uma coisa chama atenção: como o discurso do “vilão” parece seduzir, quem sabe até soar empático, ao próprio autor. Faz sentido? Fale sobre isso.
F. K. – Não só empático, eu sou um vilão. Eu tenho algo de Lex Luthor e Maga Patalójika. Está realmente tatuado no meu braço: Vilania. Quando eu era criança, eu era apaixonado por histórias de super-heróis, mas eu odiava aquelas camisas de heróis genéricas com imagem mal editada e sobreposta num quadrado horroroso no meio da camisa branca. Eu queria usar exatamente a mesma coisa, só que com Pinguim, o Lex e o Coringa. Ninguém na minha cidade fazia isso nos anos 2000. – Hoje tenho a minha Magneto was right. – Na verdade, eu não entendia o porquê de eles adorarem os heróis e eu odiava. Numa boa, protagonista é sempre chato, mas eles saciam nossa sede de sangue. Eu, definitivamente, não queria ser um fã de herói, mas era “errado” gostar de vilão. Até que eu conheci Erik Magnus com sua roupa roxa e vermelha e seu elmo imponente, Magneto foi quem me despertou para a vilania. O Coringa é um vilão interessante, ele é caótico. O Duende Verde é maníaco. O Pinguim é um mafioso e assustador. A Mulher-Gato é divertida e sexy. O Charada… é, eu gostava do Charada. – Percebam que eu curto muito mais a DC – Mas Magneto não era isso. Ele tinha um ideal, havia uma luta e era sobre vida. E mesmo assim, parecia pedir demais para os humanos que os Morlocks não precisassem se esconder nos bueiros, que os mutantes não fossem perseguidos e escravizados por Sentinelas ou pelo Sr. Sinistro. Foi quando eu descobri que era pedir demais viver sem me ajoelhar ao herói. Só que eu não tenho rei. Ver dignidade brotar no oprimido dói em quem tem sonhos eróticos com o poder. Às vezes, meus laços mais moderados me clamam para ser menos violento, aceitar o sistema. Mas o que adianta? Pra gente como eu, fingir ser bonzinho e agradável, não faz diferença nenhuma. A nossa sociedade diz que todo mutante deve morrer ou ser totalmente sujeitado. – Brasil, ame-o ou deixe-o – A criança viada, a menina masculina, a drag preta, a travesti, o soropositivo, o indígena, todos sofremos a instabilidade de existir. Sempre vivemos a um passo de um governo que mate 700 mil pessoas e é quase reeleito. Por isso, respondendo oportunamente a um último detalhe da quarta pergunta, Kairos vem de Kairós, um momento certo, uma disruptura, um tempo não cronológico, mas também – um pouco de ironia – é o tempo de Deus. Kairos é o que vem para dobrar os limites da narrativa. E então, quando me aceitei LGBT, foi um passo importante, mas foi só quando eu perdi essas descrições, quando eu deixei de ligar se sou bi ou se sou pan, quando não fazia mais sentido ser algo, quando virei queer foi também quando eu descobri que sou louco e vilão. Sou louco porque eu dei o passo ao abismo, eu sou louco porque acredito no que Malcolm X diz e porque acredito no que Magneto diz. Por isso eu tatuei vilania com as cores de Magneto, porque eu sou um anarquista bagunceiro, eu sou Glam Punk, meu pensamento não é estruturado para o mundo adulto, ele é para ajudar a criar pequenos arruaceiros. Eu não quero nunca terminar um livro – não irônico – e contar para meus “baixinhos e baixinhas” a moral da história. Primeiro, porque a moral do meu texto é nitidamente simples: “destrua o poder, antes que ele acabe com sua vida”. Mas, segundo, eu confio nos pequenos bagunceiros e nos baderneiros adultos que me leem, eles são capazes de serem livres e potentes quando estão longe da violência. E é sobre isso meu texto: liberdade, dignidade, amor-próprio, criatividade e, o mais importante, ódio ao Papai Noel.
R. N. – Chegamos ao fim de nossa prosa. Aqui, agradecemos cada palavra. Termina como desejar, amigo. O espaço é livre.
F. K. – Foi um prazer louco estar aqui também. Esse tipo de espaço é sempre fundamental. No mundo há muito artista intrigante pra gente ficar dando atenção pra subcelebridade vendendo jogo do Tigrinho. Como puderam ver, eu sou um escritor apaixonado pelo que faço. Gosto mesmo de me incluir nas criações, porque eu sou igualmente ficção. Meus textos são divertidos, cínicos, baixos e, o mais importante, escritos, porque assim eu sou. Pode acreditar, estão todos escritos, exceto os que eu não escrevi ainda. Mas tenham paciência, escrever 30 contos em 3 anos é fácil, mas 40 pega um pouco. Não, agora é sério, eu sou um escritor orgulhoso, 5 livros de literatura publicados e 3 artigos científicos, além dos 3 livros pirateados que orgulhosamente ostento. Arte livre sempre! Todo autor precisa de leitores, por isso eu faço experimentos com meus amigos, boto todos pra ler meus textos no mesmo segundo que termino de escrever, dos poemas aos contos. Essa semana eu até fiz uma pequena peça teatral. Então, se quiser ver experiências estético-filosóficas in loco, vire meu amigo. Busco amizades falsas com nudez verdadeira. É sempre um prazer experienciar a performance de homens, mulheres e não binários. No mais, leiam minha diva maior, Madame Lua, minha opereta rock divertida e sentimental, que está publicada pela editora m.inamalismos. E também meu menininho, que ainda falta uns dias pra sair, Poeira de Estrela, pela editora Asinhas. E me sigam no Instagram @fxalcant, que a qualquer momento posso acordar com vontade de publicar um novo livro ofensivo para todas as idades. Vivemos tempos únicos para se explorar os limites de ser arte subversiva, não é todo dia que temos apoiadores de genocida para assustar. OLHA A TEORIA QUEER NAS ESCOLAS! (EBA!) É mentira… (Aaaaaa…)
Por fim, crianças, digam sim à loucura. E se ela te responder, diga sim à química também!

Entre o Niilismo e a Anarquia, Félix Kairos é um constructo de escritas. Nasceu aos dezoito, ainda cursando Letras pela UFMG, e então se instaurou o caos. Toda a sua dor foi para a construção de uma estética artística extensa. Com publicações acadêmicas e literárias, Félix tenta buscar rupturas narrativas ou limites, que é onde nasce Kairós. Publicou Carnal (2022), O único e eterno rei Momo (2023), O lírio e a Lua (2024), Madame Lua (2025) e Poeira de Estrelas (2025). Mestrando de literatura, o autor busca ideologias que compõem um corpo político, de onde surgiram inúmeros personagens pendulares, entre o profano e o irrefreado – como Madame Lua. Alimentado pela cultura pop e outras artes, Félix Kairos constrói a passos largos um universo grande e caótico para construir um conjunto de corpos sem órgãos, de monstros, crianças e outros vilões inconformados.