Sob o céu tingido de lilás, ela caminhava com passos firmes, uma tempestade em sua alma. O mundo sempre a quis em tons pastéis — delicada, contida, um reflexo apagado do que deveria ser. Mas ela escolheu ser fogo escarlate.
Era manhã, e o sol pintava de dourado seus cabelos revoltos. Os olhares desconfiados tentavam aprisioná-la, mas ela se banhava na liberdade do não-dito, do não permitido. Seus vestidos nunca pediam licença; suas palavras, muito menos. O vermelho em seus lábios era um manifesto silencioso: “Estou aqui, inteira.”
Pessoas a chamavam de louca por recusar a submissão, má por escolher a si mesma, indomável por dizer não. Mas dentro dela havia um jardim secreto, onde flores de resistência cresciam sob a luz das memórias ancestrais. Escutava o eco distante das bruxas que vieram antes, das mulheres silenciadas que agora sussurravam coragem em cada vento.
Ela pintava o mundo com pinceladas de sentimentos — o azul da tristeza que não se desculpava por existir, o amarelo da alegria que explodia sem avisos, o roxo da paixão que queimava por seus sonhos. Cada cor era uma camada de sua história, uma revolução diária que se desdobrava em rebeldia e ternura.
Naquele dia, vestida de amanhecer, ela cruzou a praça com os ombros erguidos, desafiando as regras invisíveis. Sorriu para o horizonte, onde todas as cores se encontravam. Ela sabia que ser mulher era isso: misturar tons improváveis, carregar cicatrizes como obras de arte e, ainda assim, pintar o mundo com esperança.

Denise Camargo Lancia, é paulistana e advogada. Autora de livros de poesias, romances, contos e crônicas, possui livros publicados e participa em diversas coletâneas literárias. Escreve inspirada por seus escritores favoritos: Augusto dos Anjos, Álvares de Azevedo, Oscar Wilde, Sheridan Le Fanu, H.P. Lovecraft, Edgar Allan Poe, Mary Shelley, Bram Stoker, Charles Baudelaire e Lord Byron.