A navalhista do dia é Bruna Silva. Da jovem poeta segue 3 poemas.

Descarte
Uma válvula de escape
Que não precisa ser mais usada
Ficou largada
Parou de ser desejada
Quando não se entrega o que querem
Decidem a partida
Vão embora
Sem qualquer despedida
Jogam tudo fora
Perdem a memória
Querem saber de momento
Não ligam para o sentimento
Autocentrados
Todos eles são
Incapazes de enxergar com atenção
Agem na emoção
Pelo desejo
Todos agem
Não querem construir
São focados no descarte
Enquanto você sente
Conhecem outro alguém
Mais um contraste
Outra substituição
Procuram por algo
Nem sabem pelo o quê
Numa busca incessante
De preencher inúmeras lacunas
Sentem prazer
Rejeitam o que é bom
Aceitam o duvidoso
Abraçam o incerto
Sem assumir responsabilidades
São pela metade
Não conseguem ver os outros
Só os seus anseios
Como um papel
O descartado se sente
Sem ao menos ser lido
É jogado no lixo
Cumpriu o seu papel
O de utilidade
Nunca foi conhecido
Nem apreciado
Só estava lá
Como uma opção
Colocado numa prateleira
Sem qualquer atenção
Mergulham no raso
Não conhecem o amor
Nem a amizade
Não são de verdade
São vazios de amor
Procuram se encher
Com coisas
E pessoas
Tratam indivíduos como objetos
Usam quando querem
Veem quando é relevante
Comunicam-se pelo tédio
Não pretendem ficar
Preferem ser transeuntes
Deixam marcas profundas
E um silêncio questionável
Não tocam almas
Só corpos
Os olhares são falsos
As palavras, paradoxais
São complexados
Amam a atenção
Vivem pelo o alimento
Preenchimento de ego
Fazem vítimas por onde passam
Deixam diversos rastros
Deixam as pegadas
Deixam feridas

Raízes
Dizem que o tempo
Tudo cura
A cura, nasce da decisão
Surge da vontade
O amor que ainda sinto
Dá-me esperanças
Sua falta de amor
Deu-me incertezas
Sigo resistindo
Sentindo
E lutando contra isso
Ainda penso em você
Em seguida, anulo-me
Coloquei-me nessa situação
Aproveitou-se dela
Quando pequena
Vivenciei essa história
Eles não eram como você
Nunca esperei nada deles
De você, quis muito mais
Era similar a mim
Antes de conhecê-lo
Já nos conhecíamos
Amar você
É escolher me odiar
Gostar de você
É me desrespeitar
Tudo me prende à situação
Depois da partida
Perdi-me ainda mais
Encontro-me presa em suas mentiras
Ouvia-me
Mas não me escutava
Diálogo era sinônimo de conflito
O silêncio era estratégia
Com a chegada
Descobri-me
Com a partida
Desconstruí-me
Não viu valor em mim
E também
Não viu em si
Dei atenção às suas dores
Causou-me algumas mais
Não se importou
Com as que já existiam em mim
.

Memórias
Deitada na cama
Não tão longe de mim
Um livro
Que preciso terminar
Na minha frente
Meus dedos se embolam
No teclado do celular
Nomeiam tudo o que sinto
Penso em como a vida está boa
Relembro-me das noites mal dormidas
Dos dias que dormi chorando
Nos braços de minha mãe
Muitas coisas não estão no lugar
Mudanças não me assustam
A solitude tem me curado
Algumas dores
Passaram
Outras
Ainda doem
Estava com medo de perpetuar a dor
Não sei o que doía mais
Seguir em frente
Ou me responsabilizar
Não busco por validação
Em minha mente
Procuro por resquícios
De um amor que nunca existiu
Minha mente idealizava
Tudo o que gostaria de receber
Eu confundia
O que era real e o que inventava
Anseio por discernimento
Evitando ciclos
Dores e inseguranças
Memórias que confirmam
Que ainda estou machucada
Sinto-me atraída pela vida
Conheci novos lugares
Ouço novas músicas
Convivo com o incômodo
Não existe um destino
As decisões tomadas
Definem a vida
Antes, eu as evitava
Lembranças
Já não me paralisam
Ressignifico
Lembro-me de quem eu era
Sigo sendo o que sou

Nascida na Zona Norte do Rio de Janeiro, Bruna Silva tem 23 anos de idade e atualmente, encontra-se no 9⁰ período do curso de Letras (Literaturas/Espanhol/Português) na Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro. Desde 2002, atua como professora no Apoio Escolar Sanderberg.Pesquisadora de questões étnico-raciais e filha de pais analfabetos funcionais, dedica-se à escrita com muito amor e dedicação.
Textos bastante introspectivos. Muito bom. Parabéns