As navalhadas do dia ficam por conta de Lino Sicupira. O poeta é autor do livro Capim Limão (Editora Telha, 2023), do qual segue 7 poemas.

Bússola
Revoluções movimentam,
As internas sobretudo.
No peito a bússola
Aponta para dentro
Tormentas confluem
Meus pensamentos
E me trazem
Desassossego.
Os conflitos éticos
De existir nesse mundo
Me fazem duvidar
De tudo que vejo.
A religião
Não me serve
A política
Não me cabe
E não sei como
Encontrar um amor.
Anoiteço e amanheço
Em instantes
Sou calmo e impaciente
Educado, mas intempestivo
Há dias em que floresço
Em outros nem estou vivo.

Manifesto
Para mobilizar afeto
É preciso um passo reto
Quando a estrada faz curva.
Retirar amarras – Desnecessárias –
Usando poemas, flores ou faca.
Na preparação do terreno
Para cultivar sentimento
Não se usa trator ou enxada.
Se planta palavra,
Rega sensações, maneja traumas,
O que se colhe às vezes agrada.

Maximalismo
Mais amor, mais querer
Mais desejos e possibilidades
Não é da natureza do homem
Regimes políticos nem alimentares.
Permita o pouco apenas
Para realizar grandes feitos
Seja mais, ame mais
Se realize mais intensamente
Caso se decepcione, ame novamente
E mais do que antes.
Crie expectativas se quiser
E queira sonhar sempre
Porque mais amor será
Sempre mais amor.

Preâmbulo
Instantes antes do sono
– Refaço meus passos –
Ao travesseiro me abraço
Sobre um lençol manchado
De ansiedade e cansaço.
Inquieto ouço o coração
Bater em compasso.
Nos pensamentos:
Os amores rasos,
Dinheiro escasso,
A vida em atraso.
Durmo.
Em meus sonhos
O mundo é farto.

Etileno
Gosto de guardar
Ideia na gaveta
Deixá-la ali
Para que amadureça.
Iniciar um verso
E deixá-lo solto
E ao reencontrar
Descobrir outro.
Gosto das surpresas
Que encontro na mala
Das coisas sentidas
Onde o sentido acaba.

Bolsa de Valores
A poesia está
Em um campo raro
Campo de coisas
Sem fins econômicos
Ou compromisso sintático.
Com finalidade
Ergonômica
Procura adequar
A vida de um homem
Para caber no abstrato.
A poesia precisa
De imediato forjar
Um jeito do afeto
Subverter o mercado.

Outono
Árvores também respiram. E não me refiro a CO2. É engraçado que as pessoas não tenham notado, mas, pra quem é árvore outono é feriado. Depois de muito trabalho elas se despem folha por folha, deixando o chão forrado daquilo que já não serve a seus galhos. E então respiram. Respiram a liberdade da nudez de sentido. É engraçado que ninguém ainda tenha notado.
Sobre o autor:

Lino Sicupira é mineiro do Vale do Jequitinhonha, graduado em Psicologia pela UFF e produtor rural. Começou a escrever poesias aos dezoito anos, quando conheceu a obra de Fernando Pessoa, além de poesias escreve contos e crônicas. Teve seu primeiro livro publicado em 2023 pela editora Telha, o livro de poesias “Capim Limão”.