A navalhista do dia é Dheyne de Souza. Fiquem com 3 poemas da autora de lâminas (martelo casa editorial, 2020) e era uma promessa; era pra cuidar; ela engravidou; ela se perdeu; (lola, 2022):

a folha
“o amor é
o que o amor faz”
(bell hooks)
se fosse fóssil
o amor
se fosse fácil
escavar silêncios nessa estrada
de
codificar
fiat fome fosso vulto
se fora força,
amor,
se furo fosco
forro betume
lápide foro
falso traquejo
testemunho
se forma forca morro muro
falha
se fosse folha
amor
alma de pluma
escrita densa
não se perfura
fuga
corpo: da terra tempo esculpido
foto
fulgor
fito
flor, broto, tronco, legado, vento,
vamos
antes de fóssil
a m o r
te
vivencio

auto
eu tenho essa espécie de
dor?
quando m-e envolvo
às vezes m-e esqueço
quase completamente
o intenso
profundo
imenso
eventualmente
cai
caindo
esqueço quase que completamente
da altura
com que subi
degraus sótãos porões poços
desaparecem
memória
às vezes acorda
um monstro
do céu do inferno de cima de baixo não importa pois
cair
necessariamente
é parte
reparte
queda, o teu avesso
nunca foi alto

sobre aquela foto sob
é sempre muito difícil
fotografar as sombras
, penso enquanto tiro foto e não importa a qualidade do aparelho
hoje escrevi um poema no banheiro
que mal chegou e já foi pelo ralo
não havia caneta papel nem aparelho
coisa linda de olhar abraçado com você
, você diz
e eu perco a
necessidade
a memória
a razão
até a poesia
, eu diria
mas respiro e espero
pacientemente
, talvez não
a hora e se houver o que
dizê-lo
com ou sem aparelhos

Dheyne de Souza escreve, é goiana e tem doutorado em Literatura Brasileira (USP). Publicou poemas em lâminas (martelo casa editorial, 2020) e era uma promessa; era pra cuidar; ela engravidou; ela se perdeu; (lola, 2022). Faz parte do coletivo de mulheres poetas Bidê Coletivo. Tem um podcast de leituras de literaturas: “escuta,” (https://open.spotify.com/show/2nW5AfPktJKFwPS9J9uzJm). Insta: @dheynedesouza.